Audiência Pública discute políticas públicas para a população LGBTQIA+

por Divisão de Comunicação publicado 04/10/2021 13h55, última modificação 08/10/2021 16h08
Debatedores abordaram violência contra LGBTQIA+ e a criação de conselho municipal.
Audiência Pública discute políticas públicas para a população LGBTQIA+

Foto: Ricardo Migliorini/CMO.

Por Ana Luisa Rodrigues

Na noite da última sexta-feira (01) foi realizada na Câmara Municipal de Osasco uma Audiência Pública com objetivo de discutir as políticas públicas para a população LGBTQIA+. Entre os principais temas do debate estavam à necessidade da aprovação de um conselho municipal LGBTQIA+, de políticas mais eficazes e de relatar a violência sofrida por esta população.

Organizada pela vereadora Juliana da Ativoz (PSOL), a audiência reuniu ativistas, integrantes de ONGs, artistas, simpatizantes, servidores públicos e os parlamentares Pelé da Cândida (MDB) — presidente da Comissão de Políticas Afirmativas de Raça e Gênero — e Ana Paula Rossi (PL).

“Pedi para meus pares assistirem a esta audiência mesmo que não viessem, porque é de extrema importância que chegue essa mensagem. Pode ser agora a hora de começar a ouvir, estar aqui, ouvir com carinho e atenção e pensar que a população é diversa. Quando a gente fala de diversidade a gente não fala só da população LGBT, a gente fala de todo mundo. Todo mundo aqui é diferente um do outro. A gente fala é de respeito, trabalho e dignidade”, declarou Juliana da Ativoz, ao expor sobre a necessidade de ouvir a população LGBTQIA+ para criar políticas públicas mais eficientes.

Érika Hilton, primeira trans eleita para a câmara municipal paulistana, gravou um vídeo para os participantes e falou sobre a necessidade de espaços de convivência, acolhimento e que se atendam as demandas específicas que são essenciais para a população LGBTQIA+. Em seu depoimento, Érika expressou a necessidade de permanecer lutando por uma sociedade que olhe com respeito e com dignidade para a comunidade.

Violência Contra LGBTQIA+

Carolina Yara, co-vereadora da bancada feminista do PSOL em São Paulo, ativista em prol das pessoas trans e que teve a casa alvejada por tiros no início do ano, falou do acesso à saúde negado à maioria da população LGBTQIA+.

“Nós precisamos de emprego, moradia, saneamento básico e acesso a saúde para que não tenhamos de morrer em clínicas clandestinas. Nós queremos acesso a saúde para não ter de morrer em decorrência da AIDS, em tempos que já temos avanços na medicina”, expressou Yara.

Presidente da comissão de Diversidade Sexual e de Gênero na OAB/Osasco, Mônica Godoy alertou sobre os altos índices de violência contra a população LGBTQIA+. “Não é novidade que estamos há anos ocupando patamares alarmantes. Em 2021, 80 pessoas transexuais foram mortas. Somos o país que mais mata trans e travestis no mundo e a expectativa de vida destas pessoas é de apenas 35 anos”, alertou.

A questão da violência contra a população LGBTQIA+ também foi abordada por outros palestrantes. Samara Sosthenes, integrante do mandato coletivo Quilombo Periférico na capital paulista, disse que está exausta em ver vidas perdidas. “Querem negar nossos corpos, nossa existência, nossa dignidade. Precisamos de saúde, educação e isso vem através de políticas públicas. Chega de sermos mortas brutalmente. Muitas pessoas perderam suas vidas pelo simples fato de serem quem são”, comentou Samara em uma fala emocionada.

Em tom de cobrança, há anos na luta pelas causas LGBTQIA+, Dumdum Lopes mostrou a mesma exaustão que Samara e disse que é preciso votar em quem apoia e ajuda na conquista de direitos. “Estou nessa luta há pelo menos 20 anos. A gente está sempre brigando, brigando, brigando. Andamos pouco pra frente. Eu nem queria falar, porque a gente fala pra gente mesmo, pois é muito difícil conseguir as coisas. Vamos votar em quem nos apoia”.

Higor Andrade, da Mandata Ativoz em Osasco, também apresentou dados relativos à violência contra a comunidade LGBTQIA+. “A cada 19 horas um LGBTQIA+ é assassinado no Brasil, o Brasil é o país que mais mata transsexuais. A cada hora, de acordo com o SUS, um LGBT precisa de atendimento médico por conta de sofrer agressões e 55% da população apresentou piora na saúde mental na pandemia”.

Andrade reforçou a necessidade de agilizar a tramitação do projeto de uso dos banheiros (PL nº 9/2021, que garante o uso de banheiros de acesso público a travestis, transsexuais e pessoas intersexo, de acordo com a sua identidade de gênero). Ele pediu políticas públicas de emprego e renda que permitam que pessoas trans possam trabalhar e apontou, também, a necessidade de capacitar profissionais das escolas para relacionarem-se com a diversidade. “Precisamos educar as crianças, inclusive para lidar com ambientes mais inclusivos, um ambiente que não seja preconceituoso”.

Legislar Para Todos

Chamando a atenção da necessidade de parlamentares se posicionarem positivamente para questões LGBTQIA+, Elvis Justino, membro do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana – CONDEPE, solicitou aos vereadores osasquenses que sejam favoráveis à criação do conselho municipal. “Mostrem que vocês estão aqui para legislar para todo mundo. Quando votam contra o conselho, vocês estão sendo cúmplices da violência, o silêncio é cumplice da violência”, argumentou.

Professora e militante, Ana Coelho apontou a necessidade de romper as estruturas e haver mais eficiência. “Devemos pensar políticas públicas inclusive na educação. Precisamos ter verba para fazer políticas inclusivas. Existimos, somos válidos, estamos aqui. Saímos daqui com a obrigação em pensar em políticas públicas e com o compromisso de romper com as caixinhas para que possamos tornar o caminho mais fácil”.

O historiador Douglas Gonçalves sugeriu uma nova visão em relação às políticas voltadas para as populações consideradas minorias e afirmou que o normal é a diversidade. “Se a gente perceber as fissuras da sociedade como um todo, a gente percebe que, na verdade, fazer política para a população LGBT, antirracista ou em defesa da vida das mulheres é fazer política para as maiorias. É fazer uma política que seja verdadeiramente democrática”, esclareceu Gonçalves.

Por Políticas Públicas Mais Eficientes

A primeira mulher trans servidora pública de Osasco, mestre de cerimônia e produtora cultural, Fabiana Muniz também deu voz às pessoas que sofrem discriminação e cobrou ações de saúde para a população LGBTQIA+ no município. “Foram pensadas diversas políticas públicas. Eu amo animais, vou deixar claro, mas temos dois centros veterinários e não pensaram em uma sala para tratamento das pessoas transexuais e para a população LGBT. Isso me causa muito desconforto, sendo servidora pública”, reforçou Muniz, que também falou sobre as inúmeras transexuais mortas vítimas da transfobia e daquelas que não tem oportunidades.

“Esse é o primeiro passo. Estarmos aqui, pós-pandemia, falando sobre políticas públicas, algo extremamente importante. Falta um olhar, um cuidado para essa classe. As pessoas precisam ter consciência que esse município tem uma população que precisa ser respeitada e não é. Precisamos de ações mais efetivas, que não precisam ser grandiosas, mirabolantes e caras. Mas ações pontuais precisam acontecer”, ressalta Flávio Mota da Costa — a Drag Tiffany —, que atua há mais de 22 anos no ramo de eventos e sente falta de políticas públicas no setor cultural para artistas LBGTQIA+.

Titular da secretaria Executiva de Política para Mulheres e Promoção da Diversidade, Mônica Veloso falou sobre as dificuldades de atuar sem orçamento, mas esclareceu que no novo PPA já há verba prevista para as ações da secretaria nos próximos anos. Além disso, Veloso reforçou a importância que o prefeito Rogério Lins dá para as pautas relativas à diversidade. “Política pública — quando ela se percebe naquilo que é de fato sua inerência, sua essência  constrói políticas eficazes de acesso universal para todo o cidadão e cidadã. Esse é um passo bastante significativo que a cidade de Osasco deu: sair de uma coordenadoria para uma secretaria executiva”, afirmou.

Criação do Conselho Municipal

O diálogo construído pelos poderes Executivo e Legislativo em Osasco foi elogiado pela ativista Sabrina Nabuco, do movimento Juntas por Barueri, que apontou a necessidade da criação de um conselho municipal para a diversidade e de políticas públicas que vão além das bandeiras coloridas. “Espero que esse movimento daqui se reverbere em outras cidades. A população LGBT precisa de políticas públicas efetivas e o conselho é o primeiro passo. Precisamos olhar para as políticas existentes e ver como elas não estão contemplando essa população”.

Silvia Helena, educadora, ativista e coordenadora do programa da secretaria Executiva de Mulheres, lembrou que a criação de um conselho municipal também depende do Legislativo e destacou os avanços que a cidade vem conquistando para a população LGBT.

“A proposta vem para a Câmara, que pode ou não aprová-la. O nosso Centro de Referência LGBTQIA+ já está concluído. O espaço já foi alugado e vai dar todo suporte à classe LGBT em nossa cidade. Vai ter um núcleo em parceria com a secretaria de Saúde dentro da Policlínica. A prefeitura está avançando cada dia mais”, afirmou Sílvia Helena.

A vereadora Ana Paula Rossi declarou que há tempos está em pauta a criação de um conselho municipal para a diversidade e que, acima de tudo, é preciso haver respeito, independentemente de políticas partidárias e religiosas. “O governo avançou pelo fato de ter criado uma secretaria Executiva. Essa angústia que mexe com vocês, mexe com a gente também. Eu percebo que estamos caminhando, mesmo que lentamente. A questão do conselho municipal LGBTQIA+ também vem de outras gestões, não é algo recente. Pra mim é uma coisa tão simples para gente tratar, é óbvio. Nós temos diversos conselhos nesse município, diversas representatividades, diversos segmentos. É algo simples”.

Em relação à resistência em torno do debate nas pautas LGBTQIA+, Ana Paula esclarece que muitas vezes o que falta é conhecimento sobre o assunto, mas que há movimentos para quebrar resistências. “Existe resistência. Na minha opinião, essa resistência é porque é uma coisa muito cultural e as pessoas se fecham. E eu acho que é por falta de informação, falta de diálogo, falta de estarem abertos a ouvir. Tem de existir políticas públicas em nossa cidade que garantam direitos. Não é favor, é direito, direito como todos tem”, concluiu.

O presidente da comissão legislativa de Políticas Afirmativas de Raça e Gênero, vereador Pelé da Cândida, explicou como tem abordado as questões LBTQIA+ com os demais parlamentares, relembrou de sua primeira legislatura e de como teve de aprender e negociar para conseguir colocar seus projetos em pauta.

“A gente tem de sincronizar, conversar com as pessoas para chegarmos a um entendimento legal e os projetos passarem. Em relação ao conselho municipal, estou disposto a lutar para que a gente possa aprovar. Vocês têm direitos, pois pagam seus impostos”, afirmou Pelé.

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