Entre a Imaginação e o Real, Nasce a Cidade de Deus

por osa — publicado 27/07/2013 12h55, última modificação 04/01/2018 11h29
Vargas é eleito pela coligação PTB/PSP com 48,7% do total de votos, contra 29,7% de Eduardo Gomes (UDN) e 21,5% de Cristiano Machado (PSD). Claro que a UDN, derrotada, apelou para o argumento da ilegitimidade da vitória de Getúlio Vargas.

 

Anos 50: vista aérea da Cidade de Deus

Anos 50: vista aérea da Cidade de Deus

Vargas é eleito pela coligação PTB/PSP com 48,7% do total de votos, contra 29,7% de Eduardo Gomes (UDN) e 21,5% de Cristiano Machado (PSD). Claro que a UDN, derrotada, apelou para o argumento da ilegitimidade da vitória de Getúlio Vargas. As exportações brasileiras de equipamentos industriais entre os anos de 1945 e 1951 cresceram 338%, enquanto o total das importações aumentou apenas 83%. 

É um grande período de evolução para a indústria nacional. A restrição à importação dos produtos de consumo e a facilidade da importação de bens de capital e matérias-primas, favoreceram a uma dupla guinada no setor industrial. Passamos de consumidores dos bens de consumo a produtores, pelo menos para o nosso emergente mercado interno.

Usando politicamente essa tendência econômica, somada ao seu ideal social, Vargas lançou o nacionalismo como prioridade de seu governo. O nacionalismo era um sentimento que unia os brasileiros, independente da classe social à qual um indivíduo fizesse parte. O presidente procurou fazer uma política que ressaltasse a necessidade de se coibir os abusos contra a ordem econômica, cometidos pelos interesses estrangeiros no país e de se promover o desenvolvimento interno, como forma de assegurar a autonomia nacional. Por isso, o Estado deveria intervir de forma efetiva na economia, com dupla finalidade: salvaguardar os interesses da população e a soberania nacional. Isso, economicamente, ficou traduzido com a atuação do governo em setores estratégicos como a energia, siderurgia e comunicações.

A oposição ficou reservada para os liberais, que estavam unidos em torno da UDN, e que propunham a construção do progresso com base predominante na livre iniciativa.

Se, de um lado, os liberais criticavam severamente a intervenção do Estado no jogo econômico, de outro, os comunistas, infiltrados, e uma parcela significativa dos sindicatos, insuflavam o operariado a reclamar das perdas salariais a que foram submetidos. Isso em razão do elevado aumento da inflação, a partir de fins de 1952.

Em seus 19 anos de governo, e especialmente no último mandato, Getúlio promovera a criação de uma série de agências para estudar, formular e implementar políticas de desenvolvimento, sempre dentro de uma ótica que valorizava a ação do Estado, a iniciativa local. Entre esses empreendimentos, figuravam o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE, hoje BNDES), bem como vários outros, de caráter setorial ou regional, como o Plano Nacional do Carvão, a Superintendência do Plano de Valorização Econômica da Amazônia, que visavam o mesmo interesse: promover o desenvolvimento econômico a partir do dirigismo estatal. Porém, os criativos homens de negócios encontravam espaço para se desenvolver na economia estatizada de Vargas. 

Em 1943, o projeto de Amador Aguiar de virar banqueiro começou a se concretizar quando, contratado como diretor- gerente da Casa Bancária Almeida, de Marília, recebeu 10% das ações, tornando-se assim um dos sócios desta instituição. De imediato, o banco mudou de nome, para Banco Brasileiro de Descontos, o Bradesco. No dia da inauguração, a morte repentina do sócio escolhido para dirigir o novo negócio fez de Amador Aguiar o diretor-presidente.

Anos 60: vista aérea da Cidade de Deus

Anos 60: vista aérea da Cidade de Deus

Aguiar era um sujeito simples, que levou seu estilo de vida para dentro do banco. Por causa de sua forma simples de ser, mudou a filosofia bancária de então: o banco, que era coisa de magnata, passou a ser banco do povo. Assim, ele foi o primeiro a acreditar e investir no varejo. Os gerentes, que antes se escondiam sem suas salas, foram enviados para a linha de frente das agências. Em vez de devolver cheques preenchidos de forma errada, o banco chamava o cliente para ensiná-lo a usar o talão corretamente. O Bradesco foi o primeiro banco a aceitar o pagamento de conta de luz e a receber declarações de Imposto de Renda. 

Amador Aguiar era homem ligado à terra e aos seus problemas. Possuía propriedades agrícolas em diversos Estados, dedicadas principalmente à cultura do café e à pecuária leiteira.

Dirigindo a Cobrinco (Companhia Brasileira de Imigração e Colonização), entidade ligada ao Bradesco, muito contribuiu para o povoamento e colonização do norte do Paraná, com a criação de importantes cidades e abertura de estradas. Naquela época, a sede do banco ficava na rua 15 de novembro, em São Paulo.

Em 1951, Aguiar assumiu a superintendência e só se tornou presidente do Bradesco em 1969, em substituição a José da Cunha Jr., genro do fundador do banco, José Galdino de Almeida.

A Cidade de São Paulo na Década de 50

Em 31 de janeiro de 1951, o professor Lucas Nogueira Garcez assumia o governo do Estado. Apesar de apoiado eleitoralmente por Adhemar de Barros, rompeu com o ex-governador quando este tentou influenciar diretamente na formação de sua equipe de governo. Professor da Escola Politécnica da USP, Garcez imprimiu um alto nível técnico em sua gestão, indicando o engenheiro Armando de Arruda Pereira para assumir a Prefeitura de São Paulo.

Em 1952, o Congresso Nacional decidiu revogar o artigo da Constituição de 1946 que obrigava a indicação dos prefeitos das Capitais pelos governadores. Convocadas eleições para o dia 22 de março de 1953, o vencedor foi um destacado vereador, que falava em "varrer" com uma vassoura todos os vícios da administração municipal herdados do ‘adhemarismo’: Jânio da Silva Quadros.

Apesar da escolha direta do prefeito, a cidade continuava sendo governada com retalhos de mandatos inconseqüentes, sem nenhum planejamento, embora entre 1940 e 1955 a produção industrial tenha aumentado em 892%.

No Diário Oficial de março de 1950, Osasco começava a falar de seus problemas urbanos. Segundo a reclamação dos moradores para os vereadores Valério Giuli e Guilhermino Lopes Gianni: "Há necessidade urgente de entendimentos com a CMTC, no sentido de ser estabelecida uma linha de ônibus entre São Paulo e Osasco, podendo aproveitar a atual linha Lapa-Presidente Altino e outra linha direta que faria o percurso por Pinheiros". Esta reclamação era a que mais pesava no bolso do munícipe do distrito, pois saía quase três vezes o valor cobrado pela CMTC, no mesmo trajeto, o que cobravam as linhas particulares que faziam o trajeto sugerido à CMTC. Neste ano, Osasco contribuía com 25 milhões de cruzeiros aos cofres do município e, em troca, tinha recebido do governo do Estado apenas um parque infantil. A grande reclamação continuava sendo a falta de água na torneira das casas, rede de esgoto, iluminação pública e ruas com um nome oficial. No entanto, o caos urbano tomava conta do distrito de Osasco, e seus moradores não podiam escolher quem administraria esse caos. 

Anos 90: vista aérea da Cidade de Deus

Anos 90: vista aérea da Cidade de Deus

O distrito industrial de Osasco recebe a Fábrica de Tecidos Tatuapé S/A em 1950, a Rilsan Brasileira S/A, Adamas do Brasil S/A, Lonaflex S/A Guarnições para Freios em 1951, e em 1952, a Benzenex Cia. Brasileira de Inseticida. 

Em 10 de março de 1953, com a presença do governador Lucas Nogueira Garcez, jornalista Assis Chateaubriand, Edmundo Monteiro, arcebispo de São Paulo Dom Paulo Rolim Loureiro, senador Alencastro Guimarães e diretores do banco, foi inaugurado o núcleo residencial dos funcionários e a matriz central de serviços, que recebeu o nome de Cidade de Deus. 

Amador Aguiar imaginou uma cidade tranqüila, onde o afastamento e o isolamento da grande metrópole trouxessem maior rendimento ao trabalho dos seus funcionários. Para dar forma concreta ao seu sonho, planificou uma “cidade-padrão”, onde seria o núcleo residencial e a sede do banco.
O local escolhido para a construção foi um lindo bosque de eucaliptos, plantado pelo Dr. Domingos José Nogueira Jaguaribe Filho, no final do século XIX. Na ocasião da compra do terreno, o jornalista Assis Chateaubriand, buscando inspiração nas obras de Santo Agostinho, batizou o local de “Cidade de Deus”.

Em 1956, Amador Aguiar criou a Fundação Bradesco, com o objetivo de proporcionar educação e profissionalização a crianças, jovens e adultos. Sua visão perspicaz do mundo dos negócios deu ao Bradesco, em 1959, a inédita posição de maior banco privado da América do Sul.

Inaugurou a primeira escola da Fundação Bradesco em 29 de junho de 1962, na Cidade de Deus, em Osasco, com 300 alunos e 7 professores. Atualmente, hoje estudam 7 mil alunos em duas unidades.

No dia 10 de março de 1968, ocasião dos festejos do “Jubileu de Prata” do Bradesco e do 15° aniversário de fundação da Cidade de Deus, ao inaugurar a maior praça de esportes da região Oeste, o governador Dr. Roberto de Abreu Sodré disse, em seu discurso: “A empresa, hoje, não é um mero negócio em que o empresário só se preocupa com lucro, mas deve ter seus olhos voltados para o empreendimento, para o progresso do país e para o bem-estar social”.

Quem visitava a Cidade de Deus no período em que Amador Aguiar era vivo podia observar um pequeno zoológico ao lado do edifício matriz, símbolo maior da amizade entre o fundador do banco e a natureza.

A Cidade de Deus, dos seus prédios, suas ruas arborizadas, seu aspecto urbanístico, sua banda marcial, o grupo escolar - hoje Fundação Bradesco, a moderna praça de esporte, a cooperativa - Super Mercado, a caixa beneficente.

Quando da instalação do município de Osasco, toda a diretoria do Bradesco se colocou à disposição do primeiro prefeito, oferecendo, dentre outras contribuições: a doação de móveis e utensílios para o início de sua gestão; o recolhimento antecipado dos impostos; e crédito à prefeitura para que nada faltasse ao Executivo e ao Legislativo, para o bom desempenho das suas funções.

Amador Aguiar recebeu o título de “Cidadão Osasquense”, através do Decreto Legislativo n° 768, de 15 de março de 1969, em sessão solene realizada no seu gabinete, na Cidade de Deus.

Bibliografia
Jornal Municípios em Marcha - 17/06/1969
Histórico da Fundação Bradesco
FGV/CPDOC – Centro de Pesquisa e Documentação

Uma Locomotiva no Bradesco

Mara Danusa

O Bradesco comprou da Companhia Paulista de Estrada de Ferro, e instalou na Cidade de Deus, em um dos jardins, como monumento, em homenagem não somente ao trabalho e ao desenvolvimento sócio-econômico que ela proporcionou mas, também a própria Cia Paulista que a utilizou. 

O fabricante da locomotiva é a empresa americana The Baldwin Locomotive Works que a fabricou em maio de1912. O número de fabricação dessa bela máquina é 37317 e entrou em atividade em janeiro de 1913 no Brasil. Trabalhava no trecho Trabiju - Dourado e transportou tanto passageiros como carga. Puxava de 5 a 6 vagões com combustível de lenha. A velocidade máxima desenvolvida pela locomotiva era de 35km por hora. Seu número de patrimônio na Cia Paulista era de 861. Saiu de atividade em março de 1958. Foi totalmente recuperada para ser instalada na Cidade de Deus e recentemente recebeu sua última restauração. Sua bitola, largura que há entre um trilho e outro, é de 1 metro.

 

Mara Danusa